Renúncia é um não que detesta ser não?
Renúncia é um não que detesta ser não?
Por que o computador nos faz perder tanto tempo se o inventamos para ganhar tempo?
“Casa é ilha. E o teu amor é sempre travessia.”
“- Os americanos estão vendo seu estilo de vida piorar, a pobreza aumentar etc. Mas não há manifestações de rua nos Estados Unidos. Por quê?
A razão de não termos nos Estados Unidos o que ocorreu na Praça Tahrir é que a nossa classe média empobrecida, a quarta da geração de classes médias americanas desde a 2ª Guerra Mundial – entre as quais sempre prevaleceu o mote ‘mais, mais, mais’ -, está em choque. O governo tirou verbas dos contribuintes para dar aos bancos, que sentaram em cima desse dinheiro, e as pessoas estão sofrendo. A desigualdade na sociedade americana aumentou de forma extraordinária. Isso fica evidente quando analisamos alguns dados que saíram recentemente. Na cidade de Nova York, o 1% no topo da população com maior renda ganha 44% de tudo que é gerado na economia da cidade. Nova York sempre foi desigual, mas não a esse ponto. Em 1980, antes do início da era global, o 1% ganhava 12% da renda da cidade, o que é um pouco mais razoável do que 44%. Digo isso só para dar uma noção de que quanto mais riqueza uma parte do sistema acumula, mais ele gera empobrecimento em seu interior. Temos uma vasta pobreza nos Estados Unidos, milhares perderam suas casas e vivem em acampamentos. Então por que os americanos não estão nas ruas? Em última análise é porque vivemos num sistema extremamente repressivo. E isso pouca gente percebe, pois a forma de repressão é bastante sofisticada, ela é sistêmica, está diluída no nosso dia a dia. Não é que o Estado reprima. Não é isso. Aliás, pode-se falar o que quiser, fazer as críticas que for, denunciar abusos de poder, chamar o presidente de macaco, pode tudo. Sabe por quê? Porque justamente nada que é dito importa. Não há nos Estados Unidos a voz política que deveríamos ter numa democracia como a nossa. Nessa horas, eu penso em George Orwell, claro, e em como ele retrata tão bem a vontade política sendo extraída das pessoas, que sentam, estupidamente, diante de seus televisores.”
“de que nos serviria
um relógio?
se lavamos as roupas brancas:
é dia
as roupas escuras:
é noite
se partes com a faca uma laranja
em duas:
dia
se abres com os dedos um figo
maduro:
noite
se derramamos água:
dia
se entornamos vinho:
noite
quando ouvimos o alarme da torradeira
ou a chaleira como um pequeno animal
que tentasse cantar:
dia
quando abrimos certos livros lentos
e os mantemos acesos
à custa de álcool, cigarros, silêncio:
noite
se adoçamos o chá:
dia
se não o adoçamos:
noite
se varremos a casa ou a enceramos:
dia
se nela passamos panos úmidos:
noite
se temos enxaquecas, eczemas, alergias:
dia
se temos febre, cólicas, inflamações:
noite
aspirinas, raio-x, exame de urina:
dia
ataduras, compressas, unguentos:
noite
se esquento em banho-maria o mel que cristalizou
ou uso limões para limpar os vidros:
dia
se depois de comer maçãs
guardo por capricho o papel roxo escuro:
noite
se bato claras em neve: dia
se cozinho beterrabas grandes:
noite
se escrevemos a lápis em papel pautado:
dia
se dobramos as folhas ou as amassamos:
noite
(extensões e cimos:
dia
camadas e dobras:
noite)
se esqueces no forno um bolo amarelo: dia
se deixas a água fervendo
sozinha:
noite
se te cortas com papel ou feres o pé com vidro: dia
se ao comer com pressa queimas
o céu da boca:
noite
se pela janela o mar está quieto
lerdo e engordurado
como uma poça de óleo:
dia
se está raivoso
espumando
como um cachorro hidrófobo:
noite
se um pinguim chega a Ipanema
e deitando-se na areia quente sente ferver
seu coração gelado:
dia
se uma baleia encalha na maré baixa
e morre pesada, escura,
como numa ópera, cantando:
noite
se desabotoas lentamente
tua camisa branca:
dia
se nos despimos com ânsia
criando em torno de nós um ardente círculo de panos:
noite
se um besouro verde brilhante bate repetidamente
contra o vidro: dia
se uma abelha ronda a sala
desorientada pelo sexo: noite
de que nos serviria
um relógio?”
“Eles falavam muito pouco do que sentiam um pelo outro. Não havia necessidade de frases bonitas e pequenas atenções entre amigos tão experientes.”
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