“Houve, na última década, uma evidente, ainda que moderada, melhoria das condições sociais. As famílias mais pobres passaram a receber um auxílio que, embora pequeno, aliviou a miséria e abriu janelas de esperança para os seus filhos. Os jovens tiveram acesso a empregos com carteira assinada, ainda que de baixa remuneração e em condições precárias. Os salários subiram, a começar do mínimo, que teve uma valorização da ordem de 70%. Mesmo depois de três anos de baixo crescimento do PIB, as categorias organizadas continuam a conseguir aumentos reais. (…)
Pode-se argumentar que tais avanços significam pouco em face do tamanho da pobreza e da desigualdade brasileiras, o que não deixa, também, de ser verdade. Porém deve-se considerar que tendo conseguido mantê-los ao longo de toda uma década, os efeitos são cumulativos. A esta altura já existe toda uma geração formada em ambiente menos excludente. Por que, então, os traços de barbárie social, nos quais é possível enxergar a perversidade específica que a escravidão legou, não vão sendo atenuados? É como se, em um contexto de lento desafogo, as relações fossem tomadas por uma onda barbarizante, quando se esperava um progresso civilizatório, mesmo que incremental.”
Trecho de Brasil?, artigo de André Singer