Nunca turve as águas para que pareçam mais profundas.
Nunca turve as águas para que pareçam mais profundas.
Estou à mesa de um restaurante quando a menina de 6 ou 7 anos se aproxima e me acaricia a cabeça, sem o menor embaraço.
– Você passou água oxigenada nos cabelos?, indaga.
Sorrio e nego, fingindo nem imaginar o motivo da pergunta.
– Então por que ficaram brancos se você não é velhinho?
Tem um nascer do sol nos olhos dela?
“Tanto dia lá fora e eu aqui, recontando as estrelas do céu da tua boca.”
“Em arte, apenas os preguiçosos são capazes de fazer alguma coisa.”
– Morreu?
– Ontem.
– Meu Deus! De quê?
– Já não cabia em si.
O menino de seis anos caminha pela rodoviária se contorcendo. Precisa fazer xixi com urgência. De repente, avista o banheiro: “Mãe, olha ali o santuário masculino!”.
“Convidei uns amigos para jantar. O meu camarada enólogo incluso. E eu, antes dos convidados chegarem, fui ao supermercado do bairro comprar o vinho mais barato em exibição. Por menos de € 4, trouxe três garrafas de um tinto alentejano cujo nome omito por razões judiciais. Quando cheguei a casa, abri as garrafas e verti tudo em jarro de cristal. Os convidados chegaram. Primeiras conversas, primeiros coquetéis. E quando o jantar soou, eu anunciei aos presentes que tinha ganho de presente de aniversário três garrafas de Château Lafite que gostaria de partilhar com os comensais. Ouviram-se aplausos. O jarro veio para a mesa e, quando enchi os copos, um deles murmurou sem demoras: ‘Esse odor é inconfundível’. Fizeram-se brindes. E quando o líquido escorreu pela goelas, o meu colega enólogo olhou para mim, rosto sério, e eu temi que a pegadinha tinha chegado ao termo. Ilusão. Ele sorriu, grato, e depois arrumou o assunto com uma frase solene: ‘É o melhor Bordeaux que bebi neste ano’. Todos concordaram. Um deles, mais humilde, ainda disse: ‘João, você não deveria desperdiçar vinho desse com a gente’. Fiz cara de desagrado e concluí: ‘Se não partilhamos o melhor que temos com os amigos, partilhamos com quem?’.”
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